PEQUENA CRÔNICA DE UMA PRAÇA (44)
Ela subiu na única árvore da
praça, feito um esquilo assustado. Já viu um? Pá pá pum...o bichinho já sumiu
no meio das folhagens, ninguém viu, ninguém vê mais. Mas ela, tadinha, todo
mundo via. Entre galhos e folhas, equilibrava-se, com a cara amarrada, a
respiração ofegante. Queria ser um esquilo, para pá pá pum também, mas era
grande e alta demais para tanto, e passou a ser a atração do momento. Não dava
um pio, fechava os olhos quando alguém comentava algo, e olhava para o céu a
maior parte do tempo. Fosse ela a única viva alma naquele lugar, seria muito
bom. Mas a praça estava era cheia - e pior - virou motivo de risos e piadas.
Mas por que ela, daquele tamanho, adulta, dona de si, se transformara num
moleque que sobe em árvores em três tempos? Sua presença no alto da árvore já
era motivo de curiosidade, mas seus gestos (ou a falta deles) a transformava em
um espetáculo. Uns assoviavam, ela olhava pro céu. Outros davam risadas, ela
fechava os olhos negros. Algumas crianças tentavam subir também, ela fazia uma
cara de mal de filme de terror, de espantar incrédulos. Ao que parece, apenas o
tempo se encarregaria de tirá-la lá do alto, e mesmo assim sem explicações e
sentidos para tanta birra. Já começara a deixar de ser novidade, quando um
rapaz de barba, e voz firme e doce, se postou diante da árvore e pediu: “Meu
amor, desce. Vem pra cá, vem ficar comigo. Eu não vou mais brigar com você”.
Sabe o que aconteceu? Nadica de nada. Nothing. Nem uma piscada sequer dela. “Meu
amor, me desculpe. De coração, me desculpe”, insistiu ele. E...quem disse que
ela se interessou, se mobilizou ou sequer ouviu as juras de amor? “Meu amor...”,
e o barbudo tirou um chocolate do bolso, abriu a embalagem e mostrou para ela.
A dálmata desceu a árvore feito esquilo e pá pá pum, comeu o chocolate
inteirinho.